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Música [Crítica]

“Música” é um filme muito interessante que eu descobri por acaso e que apresenta uma boa narrativa, com boas ideias originais e uma história real surpreendente. Não achei uma obra totalmente satisfatória, como irei explicar, mas acho que os méritos sejam bem maiores que os defeitos aqui. No geral, acredito que esse seja um ótimo acerto, com muita coisa inovadora, principalmente por parte da direção.
Acompanhamos a história de Rudy, um jovem filho de brasileira que cresceu nos EUA e que tem um gosto bem peculiar por música. Rudy sofre de um tipo de sinestesia e, por essa razão, tudo ao seu redor se confunde com notas e melodias musicais. Por isso e por outras coisas, seu relacionamento com sua namorada está entrando em colapso e no meio disso tudo, ele busca espaço para repensar toda a sua vida, sua relação com sua agora ex-namorada e com sua mãe, que a única família que tem por perto. Esse “espaço”, Rudy encontra na figura de Isabella, outra descendente de brasileira que mora no seu bairro e que parece ser a harmonia perfeita para Rudy. Pelo menos, à primeira vista.
Acho que o ponto que, de cara, chama mais a atenção no longa é a sua montagem. O ritmo criado é frenético e a direção é ágil em transmitir-nos o sentimento de Rudy pela música e a sua maneira de enxergar o mundo ao seu redor. Isso é perfeitamente criado por uma direção perspicaz que se utiliza muito bem dos conceitos modernos provenientes de redes sociais como o TikTok e outras mídias que adotam um formato audiovisual curtíssimo. A forma veloz de transmitir conteúdo é adotada pelo filme muito bem, mas isso também traz certas consequências negativas. As narrativas criadas em vídeos curtos são perfeitas para o seu formato hiper-rápido e não conseguem garantir uma experiência fílmica plena, a meu ver, já que não se pode utilizar dessa celeridade o tempo todo. Assim, temos algumas inconstâncias no ritmo do filme.
A direção, a meu ver, é a parte mais importante dessa obra e perceber que o filme foi idealizado, dirigido e atuado pelo próprio Rudy Mancuso, que se tornou famoso pelos seus curtas e vídeos para internet, provam que ele sabe o que está fazendo quando transfere muito do seu conhecimento com seus vídeos virais para as telonas. Mesmo que a montagem seja importantíssima para a transmissão da energia central do filme, a sua direção é ainda mais perspicaz em nos guiar por todo esse frenesi sem que percamos a atenção ou o interesse. Os cortes rápidos e as coreografias bem executadas fazem uma mistura entre os estilos de um filme de ação com um musical, mesmo que o longa não seja propriamente nenhum dos dois. Claro que a música está presente na trama, mas não assume aquele papel de quebra total da diegese como em musicais mais convencionais. Assim, as “alucinações” de Rudy são aceitas pelo espectador ao longo da narrativa de maneira mais natural. E isso foi um ponto importante para o meu apresso pela obra, já que eu não sou lá grande fã de musicais tradicionais, fora as animações.
Uma coisa que me incomodou no filme e que quebrou um pouco com a naturalidade da obra foi a mistura de idiomas. Os diálogos que misturam o português e o inglês me pareceram muito falsos e sem sentido. Não sei dizer exatamente se essa dinâmica usada no filme é totalmente falsa, mas, de qualquer forma, me causou um incômodo por me parecer muito forçado a utilização da linguagem estrangeira sem qualquer sentido narrativo. A mistura de idiomas seria mais entendível num contexto de primeiro contato com um local estrangeiro e um processo de transição, mas aqui isso parece que faz parte da rotina dos personagens. Sei que os americanos não gostam de legenda, mas acredito que essa seria a alternativa perfeita para manter os diálogos em português mais naturais, principalmente no contexto familiar, mantendo o inglês como o padrão para o restante. De qualquer maneira, esse foi um ponto que me causou um estranhamento, mas não necessariamente acabou com a minha imersão na obra.
O filme utiliza da montagem métrica e da montagem rítmica de uma maneira mais estilística do que propriamente para nos comunicar algo. A dinâmica da obra, a meu ver, não visa transmitir conteúdo – numa pegada eisensteiniana – e sim estabelecer um compasso e definir um tom para o longa, em correlação com o assunto abordado, a música. Porém, acredito que essa escolha cause também um vício no ritmo acelerado e torne certas sequências e cenas monótonas e repetitivas, mesmo que elas em nada sejam realmente lentas. Assim como quando deixamos de assistir um vídeo com duração maior que 10 minutos para ver 20 vídeos de 30 segundos, a nossa percepção de passagem de tempo é alterada pela dinamicidade do conteúdo. Nesse sentido, quando algumas sequências desse longa apresentam um ritmo muito acelerado, outros momentos aparecem para contrapor essa fugacidade. Não que isso seja necessariamente desproposital, mas torna a obra inevitavelmente inconstante.
Por outro lado, achei a comédia e os alívios cômicos do filme muito certeiros. A montagem de novo contribui para esse acerto. As piadas aliam muito bem o texto com a direção que juntas causam o efeito desejado no espectador. Pelo menos, no meu caso. A direção apresenta também ideias bem interessantes para transmitir recorrência de eventos, “monotonicidade” da vida de Rudy e também em uma cena específica que apresenta uma passagem temporal de maneira lúdica em um plano sequência excelentemente coreografado. Essa abordagem dinâmica e inovadora deixam o filme com uma cara jovem e divertida durante quase toda a sua duração.
Para além de todo o conteúdo estético, a narrativa também me agradou bastante. Sendo baseado numa história real e sendo uma espécie de biografia do autor, gostei bastante de saber que ele esteve por trás de quase toda a produção da obra. O desenvolvimento da trama ainda guarda surpresas até a sua conclusão, com uma quebra interessante de expectativas e uma corajosa utilização de elementos de repetição e clichês para se ligar a uma temática que tanto se utiliza disso. A música em “Música” não é somente um assunto abordado, mas um dos elementos centrais da criação de sentido e da estética da obra.

Nota do autor:

Avaliação: 3.5 de 5.

Gabriel Santana

rudy mancuso e camila mendes como rudy e isabella em música de 2024
Título OriginalMúsica
Lançamento2024
País de OrigemEUA
DistribuidoraAmazon Prime Video
Duração1h31m
DireçãoRudy Mancuso

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