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O Discreto Charme da Burguesia [Crítica]

Esse é um exemplar do surrealismo com uma pegada mais sutil se comparada a outras obras do gênero. Mesmo assim, apresenta conceitos e ideias características a temática abordada em outras obras e tem uma consistente base de críticas propostas por seu diretor Luis Buñuel, conhecido por outras obras clássicas do gênero. Mesmo tendo passagens abstratas, o filme conseguiu me prender bem, sem, porém, me causar grande empolgação.
A trama segue um grupo de amigos de classe alta franceses que insistem em se encontrar para uma refeição juntos, mas nunca conseguem pois sempre há algum imprevisto que vai se sucedendo e que vão cada vez mais se tornando surreais. Interessante não é mesmo? Mesmo com algumas passagens surreais desde o início do longa, a trama vai cada vez mais se afogando nessa dispersão onírica com o caminhar da narrativa que mesmo sem uma estrutura clara, faz-se possível criar sentido a partir dela. Na verdade, esse longa me pareceu mais um emaranhado de passagens que parecem desconexas a princípio, mas acrescentam conteúdo à trama central, se é que há uma trama central também. A história que é contada passa por diversos pontos de vista, mas em suma, a protagonista do filme é a burguesia que sofre boas críticas em relação ao que seriam seus “grandes problemas”. O diretor promove a perpetuação das críticas durante todo o longa que não se resumem a classe social, mas vão além tocando em outros pontos da sociedade como a moral, a igreja e o estado. A visão de mundo de alguns personagens parece explicitar isso, deixando tão claros suas incoerências morais que parecem até irracionais. Irracional, inclusive, como toda a construção narrativa, que começa a manipular o espectador através de passagens oníricas intrusas que surgem do nada, tornando a obra uma mistura de realidade, vivência e sonhos. A metalinguagem dos sonhos com uma narrativa em abismo acrescentando camadas e camadas a história parece, na verdade, eximir o roteiro da função de criar sentido para os acontecimentos e fatos narrados, passando essa função para o espectador. Acho que, para mim, o ponto forte do filme realmente são suas críticas bem elaboradas a diversas áreas da sociedade. Parte disso vem do contexto em que o filme foi feito com o seu diretor tentando fugir da censura e ao mesmo tempo tornar o seu surrealismo mais brando para alcançar novos públicos que poderiam não se interessar por uma obra ainda mais complexa que essa. Acredito que as passagens que mais me impactaram foram as que envolviam o personagem do bispo Monsenhor Dufour, que aparece aqui como a face da igreja e suas ambiguidades. Mesmo com uma sequência ilógica e até um pouco confusa, no fim da experiência é possível entender o que acabou de ser assistido, é possível compreender as ideias centrais e o desenrolar irregular da linha central da trama. Isso fez com que o filme fosse bem mais palatável para um público maior, inclusive para mim, e ajudou a tornar o surrealismo mais conhecido.
Essa é uma obra bem interessante no final das contas. Apresenta uma perspectiva surrealista diferente das obras mais lembradas e consegue construir uma trama sólida mesmo por caminhos tortuosos. Pra mim, a experiência valeu por conhecer uma obra do gênero que eu não sou tão próximo e por observar mais um dos clássicos do cinema. Mesmo assim, a obra não me cativou tanto quanto outras clássicas, sendo uma honesta experiência mediana.

Nota do autor:

Avaliação: 3 de 5.

Gabriel Santana

Título OriginalLe charme discret de la bourgeoisie
Lançamento1972
País de OrigemFrança/Itália/Espanha
DistribuidoraMUBI
Duração1h42m
DireçãoLuis Buñuel

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